terça-feira, 31 de outubro de 2017


Lembrei-me da  afirmação  com que Aristóteles inicia a sua Metafísica: “Todos os homens têm, por natureza, um desejo de conhecer: uma prova disso é o prazer das sensações, pois, fora até de sua utilidade, elas nos agradam por si mesmas e, mais que todas as outras, as visuais...”.

Acho que Aristóteles errou. Isso não é a verdade dos adultos. Os adultos já foram deformados. Acho que ele estaria mais próximo da verdade se tivesse dito: “Todos os homens, enquanto crianças, têm, por natureza, desejo de conhecer...”.

Para as crianças o mundo é um vasto parque de diversões. As coisas são fascinantes, provocações ao olhar. Cada coisa é um convite.

Aí a Dinéia sumiu. Pensei que ela tivesse voltado para a mãe. Engano. Alguns minutos depois ela voltou. Estivera examinando uma coleção de livros. “Sabe aqueles livros, todos de capa parecida? Os
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três primeiros livros estão de cabeça para baixo.” Retruquei: “Pois
ponha os livros de cabeça para cima!”.

Ela saiu e logo depois voltou. “Já pus os livros de cabeça para cima.” E acrescentou: “Sabe de uma coisa? O livro com o número 38 está fora do lugar”. Aí aconteceu comigo: fui eu quem ficou estupi- dificado... Ela, que não sabia escrever, já sabia os números. E sabia mais, que os números indicam uma ordem.

Fiquei a imaginar o que vai acontecer com a Dinéia quando, na escola, os seus olhinhos curiosos forem subtraídos do fascí- nio das coisas do mundo que a cerca, e forem obrigados a seguir aquilo a que os programas obrigam. Será possível aprender sem que os olhos estejam fascinados pelo objeto misterioso que os desafia?
Pois sabe de uma coisa? Acho que vou fazer com a Dinéia aquilo

que Joseph Knecht tinha vontade de fazer...

Teresa Oliveira 

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